terça-feira, maio 08, 2007

Braço de ferro entre Luanda e Kinshasa

"Questão Kahemba" de novo na ordem do dia

A disputa fronteiriça entre Angola e a República Democrática do Congo, conhecida por "Questão Kahemba", voltou a ganhar atenção na imprensa de ambos os países, revelando que, longe de constituir uma questão pacífica, se trava um braço de ferro entre Luanda e Kinshasa que envolve já a Bélgica e Portugal.

A área disputada é constituída por 11 localidades ao longo de 45 km no território administrativo de Kahemba, distrito de Kwango, cujos rios e seus afluentes são abundantes em diamantes. Situa-se na fronteira entre a província congolesa de Bandundu e a província angolana da Lunda-Norte, no 7º Paralelo.

No dia 3 de Maio, em comunicado citado pela Angop, o Governo angolano acusou «certos sectores civis e políticos na RDC» de «má-fé», ao continuarem a considerar a presença das forças de segurança na região fronteiriça como ilegítima, sem acatarem as conclusões anunciadas em Luanda da comissão bilateral criada para estudar o assunto.Em consequência da polémica gerada em Fevereiro passado na imprensa congolesa sobre a alegada invasão, foi constituída uma comissão técnica bilateral angolana-congolesa que se deslocou, entre 25 de Março e 11 de Abril, por terra e de helicóptero à região contestada.
Tinha esta por missão identificar os «22 dos 32 marcos que delimitam a fronteira entre os dois países», para o que terão recorrido a autoridades tradicionais, militares e a tecnologia GPS. Luanda declara as localidades como sendo angolanas segundo linhas fronteiriças anteriores à independência. Em Kinshasa, a questão não é vista de forma tão linear.
Várias viagens foram realizadas ao local antes de 25 de Março, por representantes de vários ministérios, cujas declarações por vezes se contradisseram. Por outro lado, no início de Março, um grupo de 15 deputados do distrito de Kwango, leu à imprensa e depositou na Assembleia Nacional uma declaração com as suas conclusões de uma missão, cujos seis pontos reafirmavam o que tinha sido noticiado nos meios de comunicação congoleses até à data, e precisando ainda que o marco geodésico objecto da disputa tinha sido colocado onde estava apenas em 1972 por um investigador americano.

No entanto, os chefes tradicionais de Kahembe contestaram também a opinião dessa comissão, argumentando que as fronteiras se mantêm inalteradas desde os finais do século XIX. Aguarda-se assim com grande expectativa o relatório do parlamento congolês para os próximos dias, a cargo do deputado Roger Lumbala.
Pisando um território delicado, o relatório da Comissão Lumbala deverá por um lado não hostilizar Angola, aliado tácito e poderoso de Joseph Kabila, ainda no recente confronto com as forças do ex-vice-Presidente Jean-Pierre Bemba, e, por outro lado, tranquilizar os congoleses sobre o que é visto como uma violação da integridade territorial evocativa dos problemas no Norte-Kivu com os países vizinhos.

Qualquer que seja a resposta, não vai ser possível evitar questões espinhosas. Se a comissão parlamentar chegar à conclusão que aqueles 45 km são congoleses, o país entrará em rota de colisão com Luanda. Se os territórios pertencerem a Angola, entre várias perguntas legítimas estão, por exemplo, desde quando (a independência da RCD remonta a 1960), por que razão os seus administradores têm sido pagos por Kinshasa e porque se abriram assembleias de voto em pelo menos algumas dessas localidades nas eleições de 2006, o que só foi feito em território congolês.

Foi entretanto formada uma comissão quadrilateral que inclui, para além dos dois países vizinhos, os antigos poderes coloniais, a Bélgica e Portugal, porventura uma indicação das dificuldades da "Questão Kahembe" e da necessidade de envolver mediadores no processo de resolução.

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